O Brasil, a greve e a Copa do Mundo

Todos nós sabemos que grande parte das universidades federais estão em greve. Mais de um milhão de estudantes se encontram no modo “stand by”, apenas

Todos nós sabemos que grande parte das universidades federais estão em greve. Mais de um milhão de estudantes se encontram no modo “stand by”, apenas esperando para que as aulas recomecem.

Os alunos nada têm a ver com os motivos que causaram essa paralisação. A razão imediata para a greve é a deficiência na remuneração e na estrutura de carreira dos professores. Se olharmos mais profundamente veremos que ela se deve a falhas estruturais da educação no país. A greve tem total procedência e, no momento, talvez seja a única forma de atrair a atenção do governo, embora o descaso das autoridades tem apontado o contrário.

Basicamente, os professores pleiteiam por melhores salários e um melhor plano de carreira. Mais que justo. Eles passaram anos na graduação, em mestrados e doutorados para hoje desempenharem um dos papéis mais importantes da sociedade, o de transmitir conhecimento. Trata-se de uma função tão importante quanto a de carreiras muito mais valorizadas. Inclusive, como bem sabemos, é fundamentalmente com a ajuda do professor que são formados os outros profissionais.

O que me indigna nessa história são as prioridades de investimentos do nosso país. Por exemplo, se estivéssemos falando da Etiópia, um dos países mais pobres do mundo, onde boa parte de sua população já passou ou ainda passa fome, não teríamos direito de criticar a má remuneração de profissionais ou outras falhas de estrutura social. A curto prazo, sanar a fome já seria suficiente para resolver o problema mais crônico do país.

Mas estamos falando do Brasil, quinto maior país do mundo, talvez o maior em terras aproveitáveis. País com uma agricultura privilegiada que abastece vários lugares do mundo com inúmeros produtos. País em franco crescimento que nos próximos 4 anos receberá a Copa do Mundo e as Olimpíadas.

Nessa hora não tem como não notarmos a incoerência das coisas por aqui. É nessa falta de critério que eu quero chegar. Recapitulando, somos um país plenamente desenvolvível, onde falta dinheiro para a educação mas sobra para eventos esportivos extremamente caros e de impacto efêmero.

Quando usei o verbo sobrar, não foi por acaso. A impressão que tenho é que estamos muito bem financeiramente para promover eventos tão onerosos quanto estes. De fato, são acontecimentos marcantes, grandiosos, que entram para a história, isso todos nós sabemos. Assim como também sabemos, ou temos a impressão que as autoridades brasileiras não sabem fazer orçamento de projetos. É impressionante como os valores iniciais de um projeto feitos na teoria sempre são extrapolados na prática. Claro que trata-se de algo complexo, mas a tamanha discrepância dos valores não é nada justificável.

Acontece mais ou menos assim: as autoridades responsáveis pela execução calculam, por exemplo(números hipotéticos), que a Copa do Mundo e as Olimpíadas custarão ao país, respectivamente R$ 30 bilhões e R$ 20 bilhões. No entanto, na prática, esse valor acaba chegando a R$ 100 bilhões e R$ 80 bilhões. Ou seja, o que era pra ficar em torno de R$50 bilhões, acaba ficando em R$ 180 bilhões, extrapolando em 260% o valor que fora planejado anteriormente. Não estou exagerando, de fato, esses valores são extrapolados de maneira absurda.

Realmente, não sei se os planejadores são muito otimistas, incompetentes, ruins de cálculo ou se há um desvio de verba monstruoso por trás disso tudo.

Essa situação controversa, me faz comparar o Brasil aquele rico charlatão. Aquele cara que anda de Ferrari vermelha ou Camaro Amarelo, mas que não dá conta de pagar a notinha que fez na padaria da esquina. Olhando por fora parece muito bem sucedido a ponto de ostentar bens supérfluos e luxuosos mas na realidade mostra-se incapaz de sanar necessidades primárias.

É preciso rever os conceitos. O Brasil está na 84º posição no ranking do IDH(Índice de desenvolvimento humano), atrás de países como Jamaica, Cuba e nossos vizinhos Chile, Argentina e Uruguai.

Com quase 10% de taxa de analfabetismo, somos o 95º país nesse quesito, atrás por exemplo do Suriname, Equador e Zimbabwe. Nosso sistema de saúde também deixa muito a desejar. No quesito segurança, basta lembrarmos que o Brasil é um país internacionalmente reconhecido como perigoso, violento, com um índice grande de roubos e assaltos.

Enfim, não sou nenhum especialista em política, adoro nosso país e as pessoas daqui, gosto muito de futebol e esportes em geral, ficarei feliz caso compareça a um desses jogos. Mas essa incoerência sempre me intrigou e continuará me intrigando. Impossível fechar os olhos para essa situação e dizer que será fantástico que esses eventos ocorram no Brasil.

Óbvio que a ocorrência deles irá aquecer a economia do país, gerar empregos, além de outros benefícios. Mas, ainda será muito pouco perto do dinheiro a ser gasto, e inoperante diante dos muitos outros problemas de primeira importância.

Fazendo outra analogia barata, é como se o seu madruga recebesse seu primeiro salário e fosse curtir uma balada em ibiza ao invés de pagar os vários meses de aluguel atrasado.

Quanto a greve, assim como o restante dos estudantes, espero que esteja perto do fim.


Victor Monteiro Lopes é estudante do 7º período de Administração da Universidade Federal de Viçosa(UFV) e assim como quase todos os outros estudantes, já está cansado dessa greve

 

Victor Monteiro 17-08-2012 Artigos

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